O uso saudável da voz é essencial na sociedade, devido ao impacto dos distúrbios vocais no trabalho, na qualidade de vida (QV) e nas despesas de saúde pública, e devido ao valor do canto na saúde pública.
Os profissionais da voz – professores, cantores, actores, locutores, clérigos, vendedores, advogados, trabalhadores de centros de atendimento telefónico e especialistas em cuidados de saúde – constituem aproximadamente 30% da população activa (Titze et al., 1997). Estes profissionais necessitam de uma voz funcional, mas o uso intensivo da sua voz expõe-nos a danos vocais (Williams, 2003). As colisões demasiado numerosas e rápidas das pregas vocais constituem um risco profissional (Fritzell, 1996) comparável à exposição química ou solar (Titze, Švec & Popolo, 1996). As leis de segurança e saúde no trabalho (SST) ainda carecem de apoio no que respeita aos problemas vocais (Vilkman, 2001). A prevalência de distúrbios vocais continua a crescer, aumentando os custos de saúde pública (Benninger, Bryson & Milstein, 2017) e constituindo até 35% das faltas ao trabalho (no caso dos professores) (Ahlander, Rydell & Löqvist, 2011).
Existem diferentes grupos de profissionais da voz, de acordo com a quantidade de demanda e uso vocal (Koufman & Isaacson, 1991). Estes grupos são organizados considerando no topo os executantes de elite, como cantores e actores, e na base os profissionais cujo trabalho não é comprometido mesmo quando sofrem de dificuldades vocais graves (ver Figura 1).
Os problemas vocais são negativos não só em termos de capacidade de trabalho, mas também em termos de qualidade de vida (Behlau, Hogikyan & Gasparini, 2007; Cohen, Dupont & Courey, 2006Verdolini & Ramig, 2001), especialmente para as mulheres (Hunter, Tanner & Smith, 2011). As mulheres têm uma maior prevalência de distúrbios vocais crónicos do que os homens (Roy et al., 2004). As diferenças de género na voz (Klatt & Klatt, 1990; Roers, Mürbe & Sundberg, 2009) e no sistema endócrino afectam a voz das mulheres de forma mais recorrente (Lã & Davidson, 2005; Lã et al., 2007; Lã et al., 2009; Lã & Sundberg, 2012). A qualidade de vida relacionada com a voz (V-RQOL) também é mais afectada nas mulheres (Behlau, Hogikyan & Gasparini, 2007). Se as doenças vocais são um problema, então o que podemos fazer?
A consciencialização para o uso saudável da voz pode ser o primeiro passo, não só devido ao impacto que os distúrbios vocais podem ter na fala das pessoas, mas também porque o canto traz benefícios tanto a nível individual como social (Kreutz et al., 2004). O canto em grupo pode ser terapêutico (Clift, 2012) e um recurso de saúde pública (Stacy, Brittain, & Kerr, 2002). O canto é uma actividade comum e criativa para os cuidados de saúde e o bem-estar na comunidade (Bungay, Clift, & Skingley, 2010). O canto promove: a inclusão e a coesão social (Greaves & Farbus, 2006); a saúde física e mental (Glick, 2011); o bem-estar psicológico (Clift et al., 2010); e o desenvolvimento cognitivo (Bilhartz, 1999). Não é surpreendente que haja um interesse crescente nas dimensões sociais e culturais do canto e em recursos educativos de qualidade para uma utilização saudável e eficaz da voz.
Lecturas adicionales:
- Ahlander, V.L., Rydell, R & Löfqvist, A. (2011). Speaker’s Comfort in Teaching Environments: Voice Problems in Swedish Teaching Staff. Journal of Voice, 25(4): 430
- Behlau, M., Hogikyan, N.D. & Gasparini, G. (2007). Quality of Life and Voice: Study of a Brazilian Population using the Voice-Related Quality of Life Measure. Folia Phoniatrica et Logopedica, 59: 286-296.
- Benninger, M.S., Holy, C.E., Bryson, P.C. & Milstein, C.F. (2017). Prevalence and Occupation of Patients Presenting With Dysphonia in the United States. Journal of Voice, 31(5): 594
- Bilhartz, T.D., Bruhn, R.A. & Olson, J.E. (1999). The Effect of Early Music Training on Child Cognitive Development. Journal of Applied Developmental Psychology, 20(4): 615 – 636.
- Bungay, H., Clift, S. & Skingley, A. (2010). The Silver Song Club Project: A sense of well-being through participatory singing. Journal of Applied Arts & Health, 1(2): 165 – 178.
- Clift, S., Grenville, H., Morrison, I., Hess, B., Kreutz, G. & Stewart, D. 2010). Choral singing and psychological wellbeing: Quantitative and qualitative findings from English choirs in a cross-national survey. Journal of Applied Arts & Health, 1(1): 19 – 34.
- Clift, S. (2012). Creative arts as a public health resource: moving from practice-based research to evidence-based practice. Perspectives Public Health, 132(3): 120 – 127.
- Cohen, S. M., Dupont, W.D. & Courey, M.S. (2006). Quality-of-Life Impact of Non-Neoplastic Voice Disorders: A Meta-Analysis. Annals of Otology, Rhinology & Laryngology, 115(2): 128-134.
- Fritzell, B. (1996). Voice disorders and ocupations. Logopedics Phoniatrics Vocology, 6 (1): 21:7
- Gick M.L. (2011). Singing, health and well-being: A health psychologist’s review. Psychomusicology:Music, Mind & Brain, 21(1-2): 176 – 207.
- Greaves CJ. & Farbus L. 2006. Effects of creative and social activity on the health and well-being of socially isolated older people: outcomes from a multi-method observational study. Journal of Royal Society of Promotion of Health, 126(3): 134-142.
- Hunter, E.J., Tanner, K. & Smith, M.E. (2011). Gender differences affecting vocal health of women in vocally demanding careers. Logopedics Phoniatrics Vocology, 36(3): 128-136.
- Klatt, D.H. & Klatt, L.C. (1990). Analysis, synthesis, and perception of voice quality variations among female and male talkers. Journal of the Acoustical Society of American, 87: 820-857.
- Koufman, J. A., & Isaacson, G. (1991). The spectrum of vocal dysfunction. Otolaryngologic Clinics of North America, 24(5), 985-988.
- Kreutz, G., Bongard, S., Rohrmann, S., Hodapp, V. & Grebe, D. (2004). Effects of Choir Singing or Listening on Secretory Immunoglobulin A, Cortisol, and Emotional State. Journal of Behaviour Medicine, 27(6): 623-635.
- Lã F.M.B., Howard, D.M., Ledger, W., Davidson, J.W. & Jones, G. (2009). Oral contraceptive pill containing drospirenone and the professional voice: an electrolaryngographic analysis. Logopaedics Phoniatrics Vocology, 34 (1): 11-19.
- Lã, F.M.B., Ledger, W.L., Davidson, J.W., Howard, D.M. & Jones, G.L. (2007). The Effects of a Third Generation Combined Oral Contraceptive Pill on the Classical Singing Voice. Journal of Voice, 21 (6): 754-761.
- Lã, F. & Davidson, J.W. (2005). Investigating the Relationship between Sexual Hormones and Female Western Classical Singing. Research Studies in Music Education, 24: 75-87.
- Lã, F.M.B. & Sundberg, J. (2012). Pregnancy and the Singing Voice: Reports From a Case Study. Journal of Voice, 26 (4): 431-439.
- Mellor, L. (2013). An investigation of singing, health and well-being as a group process. British Journal of Music Education, 30(2): 177-205.
- Roers, F., Mürbe, D. & Sundberg, J. (2009). Predicted Singers’ Vocal Lengths and Voice Classification – A Study of X-Ray Morphological Measures. Journal of Voice, 23(4): 408-413.
- Roy, N., Merrill, R.M., Thibeault, S., Gray, S.D. & Smith, E.M. (2004). Journal of Speech, Language and Hearing Research, 47: 542-551.
- Stacy, R., Brittain, K. & Kerr, S. (2002). Singing for health: an exploration of the issues. Health Education, 12(4): 156 – 162.
- Titze, I.R., Lemke, J. & Montequin, D. (1997). Populations in the U.S. Primary Tool of Workforce Who Rely on Voice Trade: A Preliminary Report. Journal of Voice, 11(3): 254
- Titze, I.R., Švec, J.G. & Popolo, P.S. (2003). Vocal Dose Measures: Quantifying Accumulated Vibration Exposure in Vocal Fold Tissues. Journal of Speech, Language and Hearing Research, 46: 919
- Verdolini, K. & Ramig, L.O. (2001). Review: Occupational Risks for Voice Problems. Logopedics Phoniatrics Vocology, 26(1): 37-38.
- Vilkman E. (2001). A survey on the occupational safety and health arrangement for voice and speech professionals in Europe. In Ph. Dejonckere (ed.) Occupational Voice: Care and Cure. The Hague: Kugler Publications.
- Williams, N.R. (2003). Occupational groups at risk of voice disorders: a review of the literature. Occupational Medicine, 53(7): 456